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OS 27 CARDEAIS
Extraído do número 03 - 2007

Um apaixonado pela verdade que vem de Deus a serviço da Igreja



do cardeal Alfonso López Trujillo



Os oitenta anos do Papa, vividos sob o olhar amoroso de Deus, dão a impressão de um rio que corre, com vários e sucessivos chamados ao kairós, o tempo providencial de Deus.
Lendo as passagens de sua vida, que ele mesmo contou e sobre as quais refletiu com simplicidade e espontaneidade, compreendemos como, apesar dos vários momentos e circunstâncias difíceis, sua existência e sua fé foram um grande dom de Deus em sua família.
Os sucessivos chamados, no diálogo com o Senhor, aparecem como etapas e percursos diferentes e complementares que adquirem uma nova luz em sua atual missão de sucessor de Pedro.
Sua infância e sua juventude desembocaram na vocação cristã com o chamado ao sacerdócio, no generoso e convicto serviço ao Senhor. Nesse tempo de oração e de estudo emergiu o apaixonado amor pela verdade como sacerdote e teólogo, numa integração compacta. O fiel e o sacerdote, com grandíssimos dotes de professor e pensador, se unem numa realidade harmônica. Seus numerosos livros são como uma grande estrada aberta pelas muitas pessoas que deles tiraram enriquecimento, graças a sua profundidade e clareza. Não se trata de um frio exercício acadêmico, mas de um convite a mergulhar na verdade, por meio da proximidade do sacerdote e depois do bispo. Seus escritos não são lidos sem um íntimo convencimento: a vontade de se tornar mais convicto, mais cristão, com um carisma semelhante ao de Romano Guardini, ou seja, o de tornar acessíveis e menos complexos temas que não são fáceis. Hoje é comum falar em fazer teologia de joelhos, rezando. E nisso o cardeal Ratzinger sempre foi um mestre de extraordinária espessura.
Lembro-me de que durante a viagem apostólica de João Paulo II à Colômbia, por ocasião da qual tive a honra de fazer parte do séquito, o servo de Deus aproveitava a viagem de avião e de helicóptero para ler um livro de seu grande colaborador. Por muitos anos, aquela foi uma empatia impressionante, que certamente promovia um diálogo fecundo na Igreja.
Eu gostaria de me deter nos dois primeiros anos do pontificado de Bento XVI, na missão que ele aceitou ainda que seu plano fosse voltar ao estudo orante, depois de ter posto à disposição seus múltiplos talentos como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. O Catecismo da Igreja Católica seria suficiente para demonstrar quão grande foi sua dedicação.
Muitos seriam os aspectos a ser considerados, mas vou me deter em apenas um.
Já no início de sua missão como Pastor universal, Bento XV disse que não tinha um programa especial, como normalmente prometem os políticos, os governantes, etc. Ser sucessor de Pedro, princípio visível de comunhão, na direção da Igreja, está no coração mesmo de seu serviço, que ele desenvolve serenamente, firmemente, com as energias e a coragem que lhe vêm de Deus. É uma testemunha da verdade, que semeia fielmente com grande esperança. Essa é a experiência que se vê disseminada em muita gente que, apesar dos desafios de hoje, sente em seus discursos e em suas várias mensagens a clara transmissão da fé. Ela o impele, com a profundidade do teólogo, o serviço de um magistério que dá novas energias evangelizadoras à Igreja, libertando-a das tentações de um secularismo desumanizante afastado de Deus. Impressiona muito esse seu serviço, em harmoniosa continuidade com seus predecessores, mas com um pessoal selo criativo, particularmente no que diz respeito à família e à vida, que são como que uma proclamação do Evangelho e um maravilhamento pela sua beleza, em sua necessária defesa por amor da humanidade, de seu bem no tempo, na história e também escatológico. Pedimos ao Senhor que nos conserve por longo tempo este Pontífice que nos oferece o pão da Eucaristia e da fé com a clareza e a sabedoria de um catequista.
A Poliglota Vaticana prepara um livro organizado pelo Pontifício Conselho para a Família sobre o magistério relativo ao Evangelho da família e da vida nestes dois primeiros anos do fecundo pontificado do Santo Padre. Tudo com “parresia”, coragem, decisão evangélica.
Bento XVI batiza uma criança

Bento XVI batiza uma criança

Iludem-se aqueles que imaginam que seus ensinamentos sejam uma opinião, sujeita a várias e, às vezes, curiosas interpretações, e que possam se tornar um parecer que pode ou não ser acolhido facultativamente. O Pontífice repetiu diversas vezes que existem valores não negociáveis, especialmente no que diz respeito à família e à vida, e não apenas para os crentes, mas também para aqueles que, por meio da razão, têm acesso à verdade sobre o homem, uma verdade que a fé aprofunda dando motivos de certeza e de esperança. Não há diversos magistérios da Igreja, e o que o Papa proclama com amor de pastor é o caminho seguro, que não deve ser relativizado. É um fato que se constata em todos os seus discursos, que ele pronuncia movido pelo Espírito e que não constituem uma ingerência indevida no mundo político.
O coração do Papa, como servidor, sempre foi aberto a Deus, do qual vem a certeza da fé. O Pontífice está também atento ao diálogo com o mundo, com as diversas religiões, com respeito e fidelidade ao que exige a identidade cristã. Estimulou o ardente desejo de um verdadeiro ecumenismo. Na Igreja de Jesus Cristo existe uma riqueza de comunhão entre os pastores, que reconhecem e admiram o Papa como rocha da fé, na sua plena dedicação ao rebanho a ele confiado, que guia com amor. E essa me parece ser a essência do serviço petrino (cf. Lc 22, 32). Ele acolheu com gratidão, por exemplo, as proposições do Sínodo, na exortação apostólica Sacramentum caritatis, que sublinha o papel central da família, baseada no matrimônio, comunidade de vida e amor, santuário da vida, e o fez com decisão, firmeza e também ternura, aspectos que provêm de uma profunda antropologia humana e cristã. Os trechos dedicados a uma coerência eucarística precisa, que exige uma grave responsabilidade social, sobretudo de políticos e legisladores, quanto aos valores fundamentais, são um verdadeiro serviço a eles e à sociedade.


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