“Ninguém pode limitar os poderes do Papa”
“Enquanto o Papa é Papa, os seus poderes não podem ser limitados por ninguém. Só ele pode limitar-se. A oportunidade de pôr ou não pôr em ação determinados atos deve ser deixada sob sua responsabilidade”. Entrevista com o cardeal Mario Francesco Pompedda
de Gianni Cardinale
O cardeal Mario Francesco Pompedda
Eminência, durante a permanência do Papa no Hospital “Agostino Gemelli”, levantou-se novamente a questão de eventual “demissão” do Papa. Qual é a norma canônica nesse caso?
MARIO FRANCESCO POMPEDDA: A renúncia a um ofício eclesiástico é um instituto antigo, tão velho quanto a Igreja. Não é uma invenção recente. Todavia, o atual Código normatizou-a, especificando bem que a renúncia de ser feita livremente, portanto sem constrições, deve ser consciente e deve ser expressa. Quanto às formalidades desta expressão não há regras: o importante é que seja feita publicamente e de modo definitivo. Este instituto vale para qualquer ofício. Vale para os bispos, para os cardeais. Pode valer para o papa.
Fala-se também que na atual normativa canônica haveria uma lacuna referente ao caso em que um papa fosse incapaz de realizar o seu ministério por motivos de saúde.
POMPEDDA: Não há nenhuma norma sobre isso, porque na Igreja não há nenhuma autoridade terrena além do papa e que possa, portanto, declarar morto um pontífice ainda em vida. Entretanto, na constituição apostólica Universi Dominici gregis aparece duas vezes a expressão: “Sé impedida por qualquer motivo ou causa vacante”. Com efeito, trata-se de dois incisos e estão simplesmente recordando que as disposições no caso de morte ou renúncia do pontífice podem valer também em outras eventualidades que comportem a vacância de um diocese e que são contempladas pela tradição canônica, como, por exemplo, o impedimento ou a manifesta heresia...
Impedimento quer dizer também não poder falar?
POMPEDDA: Absolutamente não. Pode-se falar de sé impedida quando um bispo é exilado ou aprisionado e que portanto – isolado – não possa comunicar com a Igreja da qual é pastor. O caso em que um bispo não possa se exprimir com a palavra é diferente.
POMPEDDA: O importante é que um bispo – e por analogia também o papa – possa exprimir a própria vontade de modo claro e manifesto. E isso pode acontecer por meio de palavras, por escrito ou mesmo por gestos, com expressões que manifestem claramente a sua vontade. Sobre isso eu já recordei o caso do cardeal de Milão Andrea Ferrari, que no século passado, na última fase da sua vida, não podia falar e governava a diocese com bilhetes escritos nos quais manifestava suas próprias decisões.
O cardeal Jorge María Mejía afirmou que considera “auspicioso” que o Papa tenha escrito uma carta de “disposições” no caso de ficar “inabilitado”.
POMPEDDA: Não tenho conhecimento de documentos desse gênero. Teoricamente posso dizer que esse tipo de ato teria valor desde que tivesse sido livremente escrito e não resultassem retratações, escritas ou verbais acrescentadas posteriormente à data do ato em questão.
O Corriere della Sera de 6 de fevereiro publicou um comentário no qual se prevê “um redimensionamento dos seus [do Papa, ndr] atos governamentais e de magistério” e teme-se uma situação de fato que “talvez imponha uma diminuição de ‘atos’ cumpridos em nome do Papa”.
POMPEDDA: Enquanto o Papa é Papa os seus poderes não podem ser limitados por ninguém. Só ele pode limitar-se. A oportunidade de pôr ou não pôr em ação determinados atos deve ser deixada sob sua responsabilidade. Convidaria a todos, leigos ou eclesiásticos, para que se abstenham de fazer previsões desse gênero.